sábado, 28 de setembro de 2013

Atenção.

Queria fazer um pedido aos amigos simpatizantes e ativos dos movimentos contra Belo Monte: estou precisando de materiais de TODO TIPO - impressos e por e-mail (lailamaiac@gmail.com) para maiores esclarecimentos em torno da empresa que está acabando com a vida no Xingu, pois estou ministrando aulas em uma comunidade chamada Ressaca, que está sendo afetada diretamente com as barragens, por isso pretendo esclarecer melhor através das aulas, sobre o assunto a esta comunidade. E qual melhor meio senão a educação para ajudar?! 
Por favor, quem puder ajudar ou souber quem possa ajudar, me dê o papo.

quarta-feira, 25 de setembro de 2013

segunda-feira, 23 de setembro de 2013

Ganhei um xodó.


No turno da noite, tenho um aluno de verdade matriculado e uma aluna que quer ser de verdade matriculada.
                                                              
        Essa coisa linda se chama Rosa. É uma arara da espécie Maracanã e vive solta pela comunidade, e pra minha alegria ela escolheu a casa da dona Rosinele para viver. 
       A Rosa morava com uma outra senhora que vivia na Ressaca e morreu ano passado. Daí ficou por lá, e é livre, cheia de vida e adora um cafuné.
       Voa por todos os lados e adora fazer visita às casas. Volta e meia dá uma espiadinha nas aulas, e  nas crianças correndo na hora do recreio.
       Essa Curica é geniosa que só ela. É danada e quando quer algo, tem que ser na mesma hora em que solicita, porque senão.... voa em cima dando beliscadas fortes. Eu mesma, já coleciono algumas cicatrizes desses surtos dela.
       É ela quem me acorda todos os dias bem cedo, por volta de 6h15. Desce do canto onde dorme , pelos punhos da minha rede até alcançar o mosquiteiro e, acima da minha cabeça, ela começa a resmungar alguma coisa na língua dela. E só se quieta quando eu levanto o mosquiteiro e coloco ela bem em cima do meu lençol. Ela se ajeita pra se aquecer um pouco e logo depois começa a sacanagem dela: se joga, rola de peito pra cima, malina... é uma graça! Depois das peraltices da arara, levanto pra banhar (não no Rio), no chuveiro mesmo. Depois tomo meu café ao lado de alguém da casa, ou mesmo com a curica. Em seguida, com roupa já de professora, passo um lápis preto no olhos, ajeito os diários de classe e só atravesso a rua, e já estou no meu trabalho. 
       Volta e meia, ouço os gritos da arara se aproximando, já passeando pelo meio da gente.  Se sentindo gente e me deixando de coração abobalhado pela companhia inusitada de todos os dias.

Vivência.

                                                                                                             Ressaca, 16 de setembro de 2013.

                                         
                                                                      Retrato do celular.

            Os dias têm sido cansativos e estressantes ( lidar com os meninos de 5ª à 8ª séries tem sido um sufoco pra não dizer um inferno. E eu até subestimei, na minha mentalidade tola de que os meninos da zona rural eram mais quietos e tal, mas eu mordi a língua. A coisa tá feia aqui também... Os moleques são tão endemoniados quanto os da cidade). E a minha carga horária é extrapolação, pois trabalho os três turnos, com duas turmas em cada um.
            Começo assim: acordo às sete horas, quando a arara - a Rosa - desce do canto dela em cima do quarto onde durmo, equilibrando-se sobre minha rede, por cima do mosquiteiro, sussurrando a língua dela até me acordar. Daí eu levanto, faço um carinho nela e vou banhar no chuveiro de água frriiiiia. Depois, tomo um café e vou pra aula às 7h30. Aí, 12h volto pra almoçar e descansar um pouco até 13h30 (o próximo turno) até às 18h.
          Ao final dessas tardes,quando o sol ainda não se pôs, ando uns 400 m para a beira do Rio para obter área no celular e é quando, respiro aliviada, ao mesmo tempo em que meu coração se entristece pela distância tão extensa de família e amigos. É que tenho um curto tempo, nos dias da semana (intervalo do 2º turno para o 3º turno de trabalho), consigo ouvir a voz da minha mãe, do meu namorado. É quando, algumas vezes as lágrimas resolvem se juntar ao Xingu, quando este sopra um vento frio que arrepia os pêlos da saudade enquanto toda a minha dor pesa sobre os ombros. 
            De lá consigo sentir o cheiro forte da vida que o Xingu carrega , assistindo à grandiosos espetáculos que a vida em si, proclama: gaivotas que pescam à beira do Rio ao lado de mulheres que lavam suas roupas e louças nos girais improvisados, enquanto suas crianças banham, brincam e gritam. Os casais de araras, papagaios e pássaros incontáveis declarando a liberdade. Os calangos gigantes caçando sem o menor pudor. A Ressaca assistindo ao formidável filme real. E... eu? Apenas vislumbrando a fabulosa cena que afaga e acalenta meu corpo e meus pensamentos mais distantes.
            Volto mais aliviada, em paz para o trabalho no turno da noite, na certeza de rever no outro dia, tal espetáculo e ouvir as vozes dos meus amores.
           O sofrimento tem sido diário, os dias até têm passado rápido, quando no final das noites de trabalho, mais um dia é riscado na folhinha. Mas tenho certeza que todo esse sofrimento será recompensado um dia.
            Minha mãe mandou um celular inteligente pra aliviar um pouco toda essa distancia. Agora consigo no fb e já tenho whatshap (093 99703381) , podem me add porque eu não aprendi a usar isso ainda. E registrar uns momentos legais. 
             Outra novidade é que eu voltei às correspondências por cartas, tanto aqui no blog quanto com uma grande amiga que está morando em uma comunidade há umas três ou quatro horas de mim. Não há correio, mas um rapaz que trabalha para as escolas, sempre está indo pras estradas, o Aurélio. Nosso carteiro. 

             Até mais.






sexta-feira, 20 de setembro de 2013

A vida que respira.


No Xingu.

Minha imagem e semelhança.



Pelos olhos e sensibilidade de Raphael Costa. 

Oi?!

                                                                                                       Vila Ressaca, 14 de setembro de 2013.

                                               Carta de uma sobrevivente urbana. Do Xingu para o mundo,
                                                                                           especialmente aos amigos da minha capital.

              Bem, como não tive tempo de despedir-me dos mais próximos - e até dos mais longínquos - vou contar-lhes como se deu meu repentino desaparecimento, deste mundo on-line, marginal e “social”.
    Pois bem, depois de seis meses formada, desempregada, procurando rumo pra eu trabalhar, aguardando promessas e cansada de ser lisa, eis que no dia 10 de agosto de uma manhã de sábado em que o sol escaldava o asfalto, meu telefone tocou e era uma das minhas amigas - a Luma, a qual estudei na universidade da vida e acadêmica, na Vigia de Nazaré, me ligou com a seguinte proposta: “Laila, tu queres trabalhar mesmo? Arrumei uma vaga pra ti aqui pra Altamira...”. E eu , no meu desespero em sair dessa somatória dos maiores problemas sociais que o país enfrenta a séculos, respondi na maior certeza que sim. E em seguida veio uma voz mais séria e rígida do outro lado da linha: “ Tu tens certeza?” E  eu dei uma pausa curta já com receio , respondi amedrontada: “Por quê mana, qual o papo?” ...e depois de um pequeno suspiro, ela que já estava confinada há pelo menos suas semanas em uma colônia à umas 3 horas de Altamira, disse o seguinte: “Mana, é interior né?! Energia elétrica é difícil, educação precária, quadro a giz, gente muito humilde, um monte de outros problemas, né mana?!”  E eu na ânsia por um trampo o quanto antes, dei a certeza que eu queria e precisava trabalhar o quanto antes. Aí, por último perguntei se valia à pena. Ela disse que sim, afinal éramos solteiras, sem pinto pra sustentar, além da experiência que teríamos no nosso currículo, e o quanto iríamos ajudar as pessoas (até então não tínhamos experiências além dos nossos estágios obrigatórios). Foi então que decidi que eu ia nessa missão. A Luma então,  pediu pra que eu fosse comprar a passagem logo para Altamira e de lá alguém iria me levar até a Vila Ressaca - o destino o qual eu viria. E... aqui estou! Completando um mês, trabalhando de segunda a sexta, ministrando aulas de Língua Portuguesa durante três turnos, da 5º à 8ª série, ( ou do 6º ao 9º ano do ensino fundamental).
             A Ressaca é bem pequena e é uma vila do município de Senador José Porfírio. Está localizada à mais ou menos 80km da cidade de Altamira. Há duas opções para chegar até a Vila: voadeira ou carro.  Pela voadeira, são duas horas de viagem e os horários são limitados, também não tem viagens todos os dias e a passagem é 40$. Pela estrada, gasta-se uma hora e trinta minutos e o acesso somente em carros particulares, pois não há outra opção de condução. 
            O nome da comunidade se deu pelo canal encurvado em forma de "U" com um baixo nivelamento da água, que segundo os moradores antigos, é um “desvio” do Xingu que forma uma ressaca. A Vila foi inicialmente habitada por garimpeiros que vieram de outros estados ou de cidades próximas com a intenção de trabalhar por aqui. Segundo os mesmos, a Ressaca já foi mais povoada e mais agitada,  e infelizmente não é mais, pois todos os garimpos da região foram fechados e por isso grande parte da população foi embora.  Hoje, há uma média de 200 a 300 moradores. Esse trecho do rio está condenado pela hidrelétrica de Belo Monte, que vai secá-lo com a construção de um canal de 100 quilômetros, o qual criará um atalho reto entre uma ponta e a outra da Volta Grande, até chegar à boca da usina. 
            É um lugar desses bem interioranos mesmo, com aqueles quintais imensos, cheios de árvores e animais por todo canto. A energia foi uma das minhas surpresas, pois aqui somente por meio de geradores motores. As casas são bem simples, de madeira, algumas com telhas brasilite, outras são cobertas por palhas. E todas as pessoas se conhecem e são compadres e comadres umas das outras. hehehe
            Tive sorte de pelo menos ter sinal de telefone à beira do Xingu, que é onde o celular tem área e fica a uns 400m da casa que eu moro. Por isso, se algum amigo aí, tentou ligar e deu caixa postal, tá explicado o motivo. A internet idem. Mas na casa em que estou morando, tem telefone fixo. Então galera, por favor me liguem tocarenteprecisandodevocês (aos finais de semana, que é quando tenho tempo.)
            Tô alojada bem em frente da escola aonde eu trabalho, na casa da diretora, a dona Rosinele. Uma pessoa super gente fina e muito receptiva. Tenho um quarto só pra mim, e na casa moram ela, o marido dela o seu Birica e os filhos, o Jhonatan, o Alan e a Rita. E mais uns bichinhos os quais tem me deixado encantada: uma arara, um louro, três cachorros, dois gatos, um jabuti e um monte de galinhas doidas.       
             No mais, acredito que consegui explicar meu sumiço. Um grande abraço em todos e antes que eu me esqueça, tenho aprendido muito por aqui, todos os dias. Não tô feliz, mas tô sobrevivendo. Busco ficar tranquila pra não pirar, porque só eu sei das dificuldades sentidas aqui. To tentando aprender com tudo e todas as pessoas aqui. Tenho sentido muita falta de qualquer coisa em Belém. O sofrimento tem sido necessário e muito valorizado por minha pessoa, mais do que tudo.

            Vou ficando por aqui. Um cheiro forte de priprioca e até a próxima.

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